Batalha Após serem punidos por assumir relacionamento gay, os ex-sargentos Alcântara e Araújo defendem outras vítimas do universo militar
Meses depois, outros soldados apresentaram fotos e vídeos das festas com a presença do coronel. Um inquérito policial militar foi aberto para apurar as denúncias, novamente arquivado por falta de provas. Rubenice pediu ajuda ao Ministério Público, mas o órgão não seguiu com a investigação. A ex-sargento alega que as testemunhas foram coagidas e ela própria foi perseguida a ponto de fugir para São Paulo, onde viveu cinco meses debaixo de viadutos e em albergues para mendigos. “E ainda assim recebi ameaças pelo celular, como ‘sua língua é muito grande, pare ou vai morrer’”, diz ela, que fez boletins de ocorrência e até tentou o suicídio. Aos 36 anos, solteira e sem filhos, hoje Rubenice mora em Belém na casa dos pais. É protetora de animais, está desempregada e sofre com síndrome do pânico. Em nota, o Exército afirma que as denúncias de Rubenice, “cuja suposta perseguição a teria levado a ser licenciada das fileiras do Exército, foram julgadas improcedentes pela Justiça Federal em Marabá, após as apurações pertinentes”.
O desfecho é recorrente não só no Brasil. Jessica Kenyon, ex-militar sexualmente abusada por colegas nos EUA, fundou a ONG Military Sexual Trauma para dar voz a outras vítimas. “Há uma relação de irmandade: se um oficial julga o outro, alguém que considera como um parente, você acha que vai acontecer o quê?”, diz Jessica. Para ela, somente quando militares de alta patente não forem mais blindados pelo sistema e receberem punições rigorosas as pessoas terão coragem de denunciar. Poucos se aventuram a desafiar uma instituição tão sólida – que deveria obedecer à legislação civil em uma democracia consolidada e não ter uma Justiça própria, como ocorre. Entidades de direitos humanos, como a ONG de Alcântara e Araújo, afirmam que a Justiça Militar é corporativista e lutam para discutir sua extinção, a exemplo do que aconteceu na Argentina após pressão de movimentos sociais. Medida que talvez reduzisse também casos de assédio moral, como o da professora de sociologia Luciana Lucena, 35 anos.